23.7.07

Outra chance para MM

Por Fernando Conceição*
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Publicado na Coluna Opinião na edição de 17 de janeiro de 2007 do jornal A TARDE
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Fora a patacoada de querer vender o Teatro Castro Alves por 30 moedas na gestão Waldir/Nilo Coelho (1987-1990), nada consta contra Márcio Meirelles (MM), o novo titular da Secretária de Cultura da Bahia. Não é ironia.
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A cultura, em todo lugar, é área estratégica desde que perdeu a inocência com o desenvolvimento capitalista. Com novos contornos adquiridos a partir da virada do século XX, tornou-se objeto de investimento, virou mercadoria. Confundida por Arte, presta-se à manipulação político-ideológicas de toda ordem, despindo-se da “aura” dos tempos românticos e quejandos, como observou Walter Benjamin (1892-1940).
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Simploriamente dita “o amálgama” que liga ou distingue indivíduos na sociedade, levando-os a compartilhar gostos, crenças, tradições, isto é, definindo identidades, a cultura também é arma poderosa. De combate ou subserviência.
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Entregue às mãos de arrivistas (aqui não falo de Paulo Guadenzi e seu séquito anterior, ele que entendia tanto de cultura como eu de mecatrônica), seu papel tem sido fortalecer e manter o status quo.
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É o que em larga medida acontece na Bahia/Brasil. A gestão cultural, invariavelmente, se dá à revelia daqueles produtores que resistem ao cabresto. É um negócio, no sentido comercial do termo, que vem enriquecendo os afortunados de sempre ou àqueles - empresários e artistas - admitidos na corte por competência ou em sua submissão. O espetáculo do Carnaval é o palco do puxa-saquismo que mais uma vez se repetirá, ontem como hoje.
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MM precisa romper com este circulo. Seu ex-chefe, José Carlos Capinam, quando no comando, frustou as expectativas do “governo da mudança”, derrubando parte da tese de Platão, de que a sociedade deveria ser comandada por filósofos e poetas. Na época, nada mudou e até piorou, a exemplo do fechamento do TCA depois que o plano de sua venda a empreiteiras foi frustrado.
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Dirigir-se ao interior do Estado, não apenas o Recôncavo, deveria ser uma tendência. Não como ato de cooptação partidária de políticos e agentes culturais, porque desta taboada estamos fartos.
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Valeria a pena MM chamar para uma conversa gente dos rincões, pessoas como Roberto “Irará” e Zé d`Abel. O primeiro tenta realizar sério trabalho no município do qual empresta o nome. O segundo, autodidata lá do sertão brabo do Raso da Catarina, há anos tem sido, para o bem ou para o mal, o mais importante produtor de eventos da região do norte, nas duas margens do Rio São Francisco.
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MM tem sorte. Wagner deu-lhe a quarta chance, depois de sua melancólica passagem anterior pelo poder. A terceira foi oferecida pela associação gestora do Teatro Vila Velha, que Meirelles com hábeis alianças a torto e à direita, recuperou e transformou em referência. A segunda e mais importante, deve a João Jorge Rodrigues, o putativo presidente do então bloco afro Olodum. Foi este que resgatou-o do limbo no qual foi largado pelos waldiristas, permitindo-lhe que montasse uma companhia de teatro que se tornou revelação nacional.
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A marca fortemente identificada com o capital simbólico da “cultura negro-mestiça” do Olodum, faz com que MM tribute a esses negros o cargo que ora ocupa. Embora tais negros e todo aquele capital permanecem no mesmo lugar de sempre: com poder esvaziado e com o saldo bancário em vermelho.
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* Fernando Conceição é jornalista, Doutor em Ciências da Comunicação pela USP e Professor da Facom-UFBA. Tem história de militância no movimento negro e quando da escrita deste artigo estava como professor visitante da Universidade de Berlim / e-mail: ferconc@ufba.br

Um comentário:

Taizola disse...

Robertinho de Irará vira referência de F.C., QUEM DIRIA...